Os grupos de foliões de Bonfinópolis de Minas dão início aos festejos de Santo Reis no mês de dezembro e as comemorações se estendem até o final de janeiro
Nesse domingo (6) foi celebrado o Dia de Santo Reis e o grupo de foliões Lopes de Oliveira entregou a folia, ou seja, terminou o giro iniciado em 2 de janeiro, na casa da família Souza. Movidos pela fé, ao longo de cinco dias os foliões passaram por mais de 30 casas, carregando a bandeira dos três Reis Magos, abençoando cada lar. Formados, na maioria por homens, durante o período de folia, os grupos não param nem para dormir. O descanso se resume a pequenos cochilos nos intervalos entre uma cantoria e outra.
Há cinco anos, na mesma data, Telmo Souza e sua família cumprem uma promessa feita a Santo Reis, depois de um dos filhos sofrer um acidente de carro e ficar em estado grave. Emocionado, o pai lembrou do momento em que pediu ao Santo que não deixasse o filho morrer. “Eu prometi oferecer a folia a Santo Reis enquanto meu filho viver. Quando terminei de pedir ele foi voltando à vida aos poucos. Só Deus e Santo Reis viram o que eu passei com ele”, contou, Telmo.
Segundo o festeiro, para conseguir receber os foliões da melhor forma possível, conta com a ajuda de amigos e familiares, tanto com doações de alimentos como também com a colaboração na hora do preparo das refeições servidas ao grupo. Geralmente, a folia na casa de Telmo é iniciada com o jantar e no final do giro, um almoço é servido aos foliões e convidados. Tudo preparado com muito carinho por cozinheiras voluntárias. “A gente ganha muita coisa. O povo gosta muito de Santo Reis. Um santo muito milagroso”, declarou.
Numa madrugada animada de folia em uma das casas da rota, o capitão do Lopes de Oliveira, sr. Elias Alves conversou com a reportagem do Diário Daqui. Ele contou, com orgulho, que o grupo foi iniciado em um quilombo, próximo ao município de Santa Fé de Minas, há cerca de 50 anos. “O nosso CNPJ é de lá do quilombo e serve para ajudar na inscrição em projetos para a compra de instrumentos e, também, para fortalecer a cultura dos quilombolas”, disse. A tradição da Folia de Reis resisti ao tempo por causa da fé católica e do carinho dedicado pela população da cidade e das áreas rurais, por onde os foliões também se apresentam. “A gente já tem o dom e é chamado para isso. Cada um é chamado para uma coisa. Não fui eu quem quis, mas Deus me chamou e eu fui cumprir a minha missão”, comentou o capitão de folia, sr. Elias.
Uma das três mulheres do grupo, a baiana Rosa Silva mora em Brasília e deixa tudo para trás nesse período para ajudar no cortejo do grupo. Para ela a Folia de Reis representa cura. “A primeira vez que participei da folia eu fui de moleta. Em 2012 eu sofri um acidente e os médicos disseram que eu não voltaria a andar. E hoje estou aqui”, disse. Rosa explica o significado da manifestação religiosa e cultural. “Para as pessoas pode ser apenas uma tradição, mas para nós foliões, é uma religião, uma fé”, afirmou.
Antes, no domingo (2/12), foi a vez da família Nunes Oliveira receber o grupo de foliões Estrela Guia, liderado pelo sr. José Vieira, que, após a cantoria, falou um pouco sobre a rotina dos foliões. Segundo ele, o grupo formado por 16 foliões permanentes, dificilmente se reúne para ensaiar os cânticos, as músicas saem com naturalidade. Sr. José conta que os foliões passam naquelas casas onde foram chamados para cantar, a quantidade de famílias visitadas depende do voto ou promessa do festeiro. “As pessoas chamam e a gente vai. A gente sempre vai cumprindo votos. Às vezes são dez casas. Depende”, explicou.
O grupo do sr. José já fez apresentações até fora do município de Bonfinópolis de Minas. Ele comentou que cada terno de folia tem toadas, rituais e estilos diferentes de se apresentar. Uns com quatro vozes, outros com sete, outros com a catira, entre outras manifestações folclóricas e religiosas, além de disciplinas. “É um grupo que anda com muita seriedade, não tem bebedeira. Se a gente descobrir alguém que esteja bebendo, a gente pede para afastar, esperar melhorar para poder voltar. A bebida pode até ser usada, mas desde que seja controlada. Na hora do almoço, tomar um golinho”, alertou, sr. José.
O Estrela Guia foi criado em 1988. Para o capitão do grupo, ser folião depende de vocação e sua equipe está aberta a receber qualquer pessoa interessada na atividade cultural e religiosa. “Se tiver vocação, tem espaço garantido. A gente convida. Alguns jovens começam a apresentar influência, a gente chama para cantar, mas por causa dos estudos, vão embora da cidade e saem do grupo”, disse. A extinção dos ternos de folia é uma preocupação do capitão, de 66 anos. “Nós já estamos velhos, se não tiver gente nova entrando, o grupo corre o risco de acabar”, lamentou. O pai do sr. José Vieira era folião, mas nenhum dos filhos dele nasceram com o dom. No próximo dia 20, o Estrela Guia se apresenta no Centro de Convivência de Idosos da Sociedade São Vicente de Paula, em Bonfinópolis de Minas e finaliza o giro em 26 de janeiro.
Sr. José lembra que, há cinco anos participou do Encontro Regional de Foliões na cidade. Grupos dos municípios de Riachinho, Dom Bosco e outras cidades se reuniram na Praça Silvézia Cândida em uma grande festa. O folião não esconde o desejo de um novo encontro. “A ideia era fazer anualmente, mas não deu. Poderíamos pensar nisso para 2020, com tempo hábil para organizar tudo”, destacou.
A Folia de Reis é declarada patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais pelo Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep), desde 2017 e, em Bonfinópolis, não recebe recursos para a preservação da cultura foliona. O prefeito do município, Donizete Antônio dos Santos não foi encontrado para comentar a possibilidade de apoiar um novo encontro regional em 2020, conforme sugerido pelo capitão do grupo Estrela Guia.
Grupo Lopes de Oliveira acaba de se apresentar em mais uma casa, durante a madrugada